Hélio Oiticica (Rio de Janeiro, RJ, 1937 - idem, 1980). Artista performático, pintor e escultor. Sua obra caracteriza-se por um forte experimentalismo e pela inventividade na busca constante por fundir arte e vida. Seus experimentos, que pressupõem uma ativa participação do público, são, em grande parte, acompanhados de elaborações teóricas, com a presença de textos, comentários e poemas.
Essa inventividade do artista pode ser em parte explicada por sua formação. Por opção familiar, ele não frequenta escolas na infância. Recebe educação formal de seu pai, o fotógrafo José Oiticica Filho (1906-1964). Em 1954, com o irmão César Oiticica (1939), Hélio inicia os estudos de pintura com Ivan Serpa (1923-1973), no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM/RJ).
Uma das primeiras obras do artista é a série de guaches sobre papel denominada, nos anos 1970, Metaesquemas. Iniciada em 1957, essa série, segundo Oiticica, já apresenta o conflito entre o espaço pictórico e o extrapictórico, prenunciando a posterior superação do quadro. Assim, em 1959, o artista marca o início da transição da tela para o espaço ambiental, o que ocorre com os Bilaterais - chapas monocromáticas pintadas com têmpera ou óleo e suspensas por fios de nylon - e os Relevos Espaciais, suas primeiras obras tridimensionais.
Em 1960 participa da 2ª Exposição Neoconcreta no Rio de Janeiro e cria os primeiros Núcleos, também denominados Penetráveis - placas de madeira pintadas com cores quentes e penduradas no teto por fios de nylon. Neles, tanto o deslocamento do espectador quanto a movimentação das placas passam a integrar a experiência. O espectador já é participante ativo nos Núcleos, mas essa participação é radicalizada pelo artista em 1963, em suas primeiras estruturas manuseáveis, os Bólides - recipientes que contêm pigmento -, resultado da vontade de dar corpo à cor e acrescentar à experiência visual outros estímulos sensoriais.
No fim da década de 1960 começa a colaborar com a Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira. Envolve-se com essa comunidade, e, dessa experiência, nascem os Parangolés, a obra mais conhecida de Oiticica. São tendas, estandartes, bandeiras e capas de vestir que fundem elementos como cor, dança, poesia e música e pressupõem uma manifestação cultural coletiva. O próprio artista assim os define: "Chamarei então Parangolé, de agora em diante, a todos os princípios formulados aqui [...]. Parangolé é a antiarte por excelência; inclusive pretendo estender o sentido de 'apropriação' às coisas do mundo com que deparo nas ruas, terrenos baldios, campos, o mundo ambiente enfim [...]" [1].
Em 1967, as questões levantadas com o Parangolé desembocam nas Manifestações Ambientais, com destaque para as obras Tropicália (1967), Apocalipopótese (1968) e Éden (1969). A Tropicália, apresentada na exposição Nova Objetividade Brasileira, no MAM/RJ, é considerada o apogeu de seu programa ambiental - é uma espécie de labirinto sem teto que remete à arquitetura das favelas e em seu interior apresenta um aparelho de TV sempre ligado. Depois que o compositor Caetano Veloso (1942) passa a usar o termo tropicália como título de uma de suas canções, ocorrem diversos desdobramentos na música popular brasileira e na cultura que ficam conhecidos como tropicalismo.
O projeto Éden - composto de Tendas, Bólides e Parangolés como proposições abertas para a participação e vivências individuais e coletivas - é apresentado em Londres, em 1969, na Whitechapel Gallery. Considerada sua maior exposição em vida, é organizada pelo crítico inglês Guy Brett (1942) e apelidada de Whitechapel Experience. Com essa espécie de utopia de vida em comunidade surge a proposição Crelazer, ligada à percepção criativa do lazer não repressivo e à valorização do ócio.
Em 1970, ganha uma bolsa da Fundação Guggenheim e instala-se em Nova York. Participa da exposição Information, realizada no Museum of Modern Art (MoMA), em Nova York, em que desenvolve a ideia dos Ninhos como células em multiplicação ligadas ao crescimento da comunidade. Volta ao Brasil em 1978 e participa de alguns eventos coletivos. Em 1980, propõe o segundo acontecimento poético-urbano Esquenta pr'o Carnaval, no Morro da Mangueira.
Em 1981, é criado no Rio de Janeiro o Projeto Hélio Oiticica, destinado a preservar, analisar e divulgar sua obra, dirigido pelos artistas Lygia Pape (1927-2004), Luciano Figueiredo (1948) e Waly Salomão (1943-2003). Em 1996, a Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro funda o Centro Municipal de Artes Hélio Oiticica, para abrigar todo o acervo do artista e colocá-lo à disposição do público.
Hélio Oiticica é um nome essencial da arte brasileira. Com seu desejo constante pela experimentação e sua preocupação com o ambiente, constrói uma obra diversa e ao mesmo tempo única, capaz de afetar o público da forma como ele deseja, convidando-o a ser parte da obra, o que ilustra também a sua crença de que arte e vida se mesclam. A obra de arte, para Oiticica, é um objeto a ser experienciado, construído, usufruído, e que ganha sentido na relação que o homem estabelece com ele. Sua arte está no mundo, assim como o mundo está na sua arte.
Nota
1. OITICICA, Hélio. Aspiro ao grande labirinto. Rio de Janeiro: Rocco, 1986. p. 79.
HÉLIO Oiticica. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2021. Disponível em: <http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa48/helio-oiticica>. Acesso em: 25 de Jun. 2021. Verbete da Enciclopédia. ISBN: 978-85-7979-060-7